Postagem em destaque

"Concreto"

Pedra, barro, massa     Mão, calo, amassa! Levanta parede  No ar  D a hora Que se levante! Mora dentro     F ora   Vi...

sábado, 1 de novembro de 2008

Fazenda Ibéria

Inventário geográfico gastronômico sentimental.
Tio Roque Villani, Rua Feijó, Rural Willis, Tia Cota, Maria de Cerqueira César Villani, Rua Gonçalves Dias, uma quadra nos separava pela Álvares Cabral, já ia com o gosto antecipado da sobremesa na memória olfato-gustativa da mexerica, da ponkan, do murkote e todos citros na boca, o cheiros dos sumos das cascas cortadas nas entranhas das ventas!
Na Rua Bandeirantes emendando com a Avenida Rio Branco (ainda sem o Teatro Municipal)já me vinha o barulho de jaca mole pesada madura passada caindo do alto da jaqueira e se espatifando nas folhas secas...Bum! Bomba doce para as abelhas e todo inseto dali... Tênis Clube das piscinas e ainda do vestiário feminino, onde minha mãe nos levava na infância (e onde vi, linda, cabeluda, anônima e inocente, na altura dos meus olhinhos tão baixos ainda, a primeira buceta, que depois demorei a reencontrar assim despreocupada, na intimidade a dois do casal, depois de muitos e ansiados anos!).
Avenida da Saudade, cemitério, meu pai Xandico, vô Luiz Egídio e vós Claudimira e Eugênia enterrados, vem os primo Nêgo, Hélio e Júlio e a prima Nana! Bolo de côco? Rosca doce no forno de barro, só a tia amorosa e Dona Benta pra me fazer comer a calda de margarina doce... E bala de alfeniz, massa quente e tixotrópica, viscosíssima, puxada nas mãos vermelhas da Nana, doceira e quituteira mór como a tia Cota!
Os primos Guto e Vivi e Maria e Paulo, menos vistos, pois mais velhos e atarefados já das coisas de adultos...mas habitantes também desse panteão de "santos idolatrados" do amor fraterno...
Depois do cemitério, escondida, a Zona, sim! a do meretrício, não tão baixo, onde muito depois eu soube de nomes como Geralda, Wanda, Nica e outras que tinham direito a luminosos de acrílico, e onde depois pude pegar fila, com os amigos de 15 anos na mesma paúra e penúria, para conhecer uma menina nova, morrendo de medo de sermos pegos pela Rádio Patrulha, vermelha e preta, da polícia militar ou preta e branca, da polícia civil...Lá entendi o que era uma "penteadeira de puta": mil e um perfumes, cosméticos baratos, bichinhos de pelúcia, às vezes uma tevezinha, o espelho enorme refletindo os corpos arfantes e as cortinas pesadas, as colchas e coxas, imagens de santos misturadas ao "pecado" do sexo!
Não tinha câmpus universitário, ninguém sabia quem era o Márcio Mesquita Serva!
Cavallari era uma loja de móveis da família de minhas amigas Virgínia e sua sobrinha, na Coronel Galdino de Almeida, acho que nem a madeireira precursora do loteamento existiam...
A Usina de Asfalto da Codemar veio depois, na Estrada de Avencas, mais íamos mais longe, cortar a chapada, itambés, vendo o Vale ao sul, depois saída da Fumares, o Rio do Peixe sem peixes, assoreado então, tão desprotegido sem suas matas galeria, areião, estrada de fazenda, o Córrego Água da Cobra, Amadeu Amaral!
A hérnia rota do tio de tanto trabalho, cortizona e analgésicos, colostomia e artrose, os tratores Massey Fergusson e Valmet roncando no arranca toco, no arar gradear, tombar, pasto vira cafezal, pasto velho vira melancial, na represa tem tilápia, lambari, peixe cachorro, carpa, traíra, já fritos na esperança do guloso!
Um churrasco mítico mora em mim, onde encontro e não em largo de todos eles, onde somos um, onde o sem tempo tem todo tempo do mundo, paraíso da memória, bons momentos congelados!
Exilado de mim, olho esse mundo com compaixão e choro a lágrima doce da saudade num dia perdido de frio e mau tempo no Marrocos, solito, solito, rodeado desses fantasmas camaradas, que vivos ou mortos povoam meu vasto coração de menino!

11 comentários:

viviane disse...

Beto, o moço com cabelos embranquecendo, caindo, ficando mais cego é alguém inesquecivel, muito querido, uma pessoa apaixonante, que vê a vida desta forma, tal como escreve, com sabor de jaca madura, de infância, com a presença de entes queridos....ele sabe viver a dimensão verdadeiramente humana da vida, suas esquinas e na presença de entes queridos, dos primos, dos tios e amigos...Obrigada Beto por este presente...com você, mais uma vez pude reviver meu passado, que também é um pouco o seu.....te (re)encontar aqui e desta forma é um privilégio. Saudades, muitas ! Vivi

Roberto Cerqueira disse...

Vivi,
Que curva da vida me fez deixar em branco a resposta desse comentário? Não sei...você o fez em um momento complicado da minha vida, um longo período de desemprego. Sei que compartilhei contigo um pedaço da vida. Somos primos. A casa da Tia Cota e, em menores proporções, as suas casas e a casa dos seus pais e a minha foram um pouco minhas, nossas. Receba meu beijo e minha fraternidade total! Beto

MALU GUILLAUMON EMMEL disse...

Não sei se chegamos a nos conhecer, a brincar juntos de " Barra Manteiga", " Pique" ou a andar a cavalo na Ibéria, mas a verdade é que seu texto também me fez voltar àqueles perfumes de mexerica , limão galego, jaca, goiaba e abiu do pomar do "Seu Roque", aquele homem tão gentil que enchia sua Kombi de crianças para leva-las à fazenda. Fui vizinha na Av. Feijó e Dona Cota era a amiga queridíssima de minha irmã Idinha.
Tantas lembranças felizes você me despertou... Gratidão!

MALU GUILLAUMON EMMEL disse...

Não sei se chegamos a nos conhecer, a brincar juntos de " Barra Manteiga", " Pique" ou a andar a cavalo na Ibéria, mas a verdade é que seu texto também me fez voltar àqueles perfumes de mexerica , limão galego, jaca, goiaba e abiu do pomar do "Seu Roque", aquele homem tão gentil que enchia sua Kombi de crianças para leva-las à fazenda. Fui vizinha na Av. Feijó e Dona Cota era a amiga queridíssima de minha irmã Idinha.
Tantas lembranças felizes você me despertou... Gratidão!

Viviane Galvao disse...

Malu, querida, penso que não nos conhecemos pessoalmente, mas com certeza temos contexos de vida convergentes. Morei na Álvares Cabral, ao lado da família Marega. Depois mudei-me para a rua 5 na Vila Fragata. Quando criança fazia pipas para a molecada do bairro. Júlio, Hélio e Luiz (Nego) eram fregueses. Também brinquei muito com Emílio e Capitão, filhos da Dona Geda, professora que lecionava junto com a Dona Cotinha. Mais tarde, na adolescência, conheci o Guto por quem me apaixonei perdidamente. Foi assim que comecei a frequentar a casa dos Villanis. Sr Roque foi um paizão para mim e Dona Cotinha minha segunda mãe . Ajudou-me a criar meus quatro filhos; Flavia, Tatiana, Gustavo e Guilherme. Fomos uma família muito feliz. Conheci todos os irmãos da D Cotinha e do Sr Roque! Um privilégio! Beto, Xandi, Mauricio estavam sempre por perto pois tio Alexandre e tia Cida também moravam por perto. Desta época tenho excelentes recordações....era na Fazenda Iberia que realizávamos as grandes e boas comemorações, as reuniões de família, casamentos, formaturas etc. Sr Roque nos deixou muito cedo. Ficou o seu legado, o do trabalho duro e perseverante. Tive o privilégio de conhecer os 8 filhos do vô Luís ( pai da D Cota).... enfim .... meu tempo de menina mariliense foi simples, mas muito rico em afetos proporcionados pela família Cerqueira César Villani.... Fui aluna da Dona Cota no coral do Grupo Escolar Thomaz Antônio Gonzaga... desde então não Canto em Corais....e para não dar a impressão equivocada de que não tinha a minha família, qualquer dia contarei algo sobre minhas peripécias com as minhas primas e primos da família Souza Galvao...beijo a você e a todos, tal como o Beto que cultuam boas recordações......

Viviane Galvao disse...

Corrigindo, desde então Canto em Corais.....

Roberto Cerqueira disse...

Malu...vagas lembranças, nasci "só" em 64...rsrsrs
E você UNKNOWN...diga quem és? Abração a todos visitantes!

Roberto Cerqueira disse...

A Vivi é uma prima querida. O Nego foi mais meu irmão que o meu irmão. Eram menos de 200 metros de distância da minha casa na Gonçalves Dias para a do Tio Roque e Tia Cota (na Feijó 255, se não me engano; depois lá foi construído um grande prédio de apartamentos). Os Bosso de um lado, os Pastana de outro. Os Mendonça na esquina. Lembro do Dr. Cásio into na frente por um tempo. No quarteirão de baixo, Ceroni, Sbragia, a turma do Pedro Paulo. Bola, pipa, bola de gude, bicicleta, aventuras no buração, bosque e nas áreas rurais, atrás de pássaros e lebistes. Muitos trotes (da linha, da pedra, da lata dágua, etc), esconde esconde, pega pega, polícia versus ladrão, etc. Uma grande turma rueira. A gente sai dali, mas ali não sai da gente.

MALU GUILLAUMON EMMEL disse...

Voltei para lá semana passada. Morei na Feijó 255, depois nos mudamos para a Bandeirantes 168. Nenhuma das duas casas existe mais. A 255, como você já "disse", se transformou em um grande edifício, junto com as casas dos Pestana, dos Villani e dos Bosso. A casa da Bandeirantes se transformou em um estacionamento. Tudo mudou muito!
Só o que não mudou foi a estrada velha de Ocauçu, cidade onde eu passava longas férias e tinha parentes. Muitas lembranças de lá também! Ocauçu mudou pouco: a catedral e algumas casas de madeira ainda estão ali. Onde meu pai teve um posto de gasolina lá pela década de 1940, outro posto está instalado. Mas a estrada velha continua linda!!! Como poucas pessoas passam por lá, a mata está bem preservada, o Rio do Peixe caudaloso, a serra continua perigosa (agora com alguns trechos concretados), mas a torre... ah! a torre!! Linda, coberta de mata até quase o seu topo, mas lá, magnânima!!!

Roberto Cerqueira disse...

Malu Guillaumon, fui aluno de uma professora que tinha seu sobrenome. A memória me trai, vejo a cara dela, mas não a matéria. Sei que tinha irmãos, talvez um dele fosse seu pai. O nome era notável, posto que havia poucos franceses no pedaço. No mais há outras traições da memória. Uma: Feijó 255 seria o enderço dos Villani e Bandeirantes 168 seria o meu endereço. Tudo somado, sua família teria vendido uma casa para o Tio Roque e outra para o meu pai? Assim seríamos uma espécie de irmãos de sangue de tijolos, eu teria passado meus anos de formação em casa que você também também viveu. Bem...a vida é isso, vamos entando e saindo de imóveis onde outros entraram e saíram. Até irmos para um imóvel que "será só nosso" (nosso sepulcro, se não formos cremados). Bem, até que outros sejam ali enterrados. Mas isso foi mórbido. O importante é notarmos que na nossa pequenez, somos deuses. Criamos um universo nesses presentes e nessas memórias. Vivamos, irmãos.

MALU GUILLAUMON EMMEL disse...

Quanta coincidência, Roberto!! Convivemos, em tempos diferentes, no mesmo espaço!!
E a sua professora foi sim, uma tia minha: ou era a Rosinha ou a Cláudia.