ÉPOCA: Qual sua opinião sobre pagamento de entrevistados ou personagens nos documentários? Pagou para fazer "Alma do Osso", ou fez algum tipo de acordo,em caso de prêmios, por exemplo?
Cao Guimarães: Sou da opinião de que, se possível, deve-se remunerar sim os personagens de um documentário. No mínimo eles estão empregando seu tempo na confecção de uma obra, ou seja, estão também trabalhando. No caso de A Alma do Osso entrevistamos mais 2 personagens (além de Dominguinhos da Pedra, que se tornou personagem único do filme). Pagamos todos eles menos o nosso personagem que se recusou terminantemente a receber qualquer pagamento. Tentamos então oferecer-lhe presentes, objetos que poderiam lhe ser útil como uma enxada, um canivete, que ele no final do filme revela que o escondeu para que quando morresse nós o resgatássemos de volta. Demos um radinho de pilha, que aparece no filme numa cena que ele mesmo sintonizou uma música para escutar. Gastamos horas tentando convencê-lo a aceitar os presentes pois ele sempre queria pagar por eles. Ou então, caso não tivesse dinheiro ali no momento, que ficasse devendo para um dia poder quitar a dívida. Fizemos o filme com um baixíssimo orçamento do qual apenas recebemos 2 parcelas até agora. Apenas os personagens, os que se dispuseram a aceitar, receberam seus pagamentos integrais. Eu tive que tirar dinheiro do meu bolso para terminar o filme, assim como a equipe técnica espera pacientemente para receber integralmente sua merecida remuneração. Sobre os dividendos que o filme possa ter, tudo é muito relativo. Não dá para fazer nenhum tipo de contrato, ou obrigação com relação aos personagens de um documentário. Fazer arte (principalmente no Brasil) é um ato de amor. Nunca ganhei dinheiro com cinema no Brasil. Se ganhasse, obviamente gostaria de dividi-lo com as pessoas que me ajudaram a fazer a obra, inclusive os personagens. Mas isso é uma questão de ética pessoal e afetiva e não uma obrigação jurídica, pois quem ganha dinheiro com um filme são principalmente pessoas intermediarias na comercialização do filme, raramente as pessoas que realmente a realizaram.
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