R., velho mestiço de sefardim, saiu do seu prédio meio mal mantido lá no Bom Retiro e foi até a delikatessen da esquina. Comprou tâmaras, romã, peixe com cabeça, challah (o pão trançado), mel, nozes, amêndoas e pistaches.
Voltou para casa e acendeu velas na menorah. Abriu um vinho e bebeu cerimoniosamente para se alegrar. Rezava internamente.
Preparou um banquete. Uma linda torta doce, com as frutas secas e o mel, lhe serviu de sobremesa.
Havia anos morava e vivia sozinho. Viúvo e com os filhos emigrados.
Reviu toda sua vida, ou os principais marcos dela, em silêncio, em alguns minutos. Sabia que o fim se aproximava. Cofiou os fios longos e brancos da barba e do belorit direito, como fazia quando se concentrava.
Espanou os pensamentos, limpou a cozinha e dormiu logo depois, profundamente, como um justo.
3 comentários:
Vejo com certo espanto, quase todo dia esses mordomos do dracula perambulando pelas ruas do bom retiro, não gosto do que vejo, são para mim simbolos da aniquilação do povo palestino, simbolo de todas as guerras financiadas por eles, não gosto mesmo, nem da arquitetura pobre erguida por eles no bom retiro. Povo metido a besta porque tem dinheiro.
Sérgio, me entenda, sou tão mussulmano quanto judeu, católico e crente para chegar ao meu agnosticismo. Acabo de ver um par desses "pinguins", um deles luzindo a camisa branca ao sol, indo pro serviço do shabat. Mas gosto das personagens, imersas em mistério e alienação. Imersas em um Deus que me foje. Identifico-me com eles e com os velhos que conheci no Marrocos...
Sérgio,
Além do mais: imagine-se vivendo em uma cultura em extinção, apegada a ritos milenares!
É tristíssimo.
Viva o samba e o borogodó!
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