Convidei minha esposa para ver o filme do Oswaldo Montenegro.
Ela disse que não ia nem amarrada. Eu não tenho esse preconceito.
Fui lá no Frei Caneca, 2 da tarde.
Assisti, infelizmente pelo lado do realizador, o filme sozinho. Sem minha mulher e sem mais ninguém além de mim na sala! Tudo bem que era 2a feira logo depois do almoço, mas não tá tendo muito público, não! Pena.
A história é boa, os atores são competentes. É uma peça de teatro filmada num galpão, recursos mínimos de efeitos e cenografia, muitas canções do autor, orçamento baixo, como imagino que devem ser os "shows teatrais" desse que é conhecido como um "chato de galochas". De novo tenho que ressalvar que, se não sou seu maior fã, estou longe de não reconhecer os méritos de seu cancioneiro de menestrel.
Quem nasceu em 1964 como eu não poderia ter vivido aquilo (os personagens tinham entre 17 e vinte poucos anos, supostamente, no ano de 1973 em Brasília). Mas vivi quase o mesmo uma década depois na USP e na UNICAMP. Lembrei tristemente do Grêmio Politécnico e da AEQ, da Poli USP, e dos cursos de teatro, do Coralatex e do DCE da UNICAMP, dos núcleos de base e reuniões de diretórios do PT de 19OO e oitenta e poucos...
Saí com um nó na garganta, típico de quem não desbundou como artista, quem não meteu a mão fundo na política nem nas humanidades e teve que se contentar com sua vidinha burocrática de engenheiro químico de múlti (e recentemente de empresa química nacional, pior ainda!)... Sentia que perdi alguma coisa, que devia ter chutado algum pau de barraca que deixei de pé.
Me deu uma vontade louca de ter uma turma como aquela, como turmas que já tive, de abraçar uma causa, de voltar no tempo.
Fiquei com aquele engulho, vontade de chorar na porta vazia da sala do cinema.
Aperto no peito, a emoção do filme queria me derrubar na tristeza de saber que mil vidas não dariam para viver tudo que nos propomos.
E tomei uma decisão com a urgência de me livrar do banzo que se abatia na minha alma.
Eu "tinha" que ir ao comício do Lula (que eu sabia que ocorreria hoje no Sambódromo, uma espécie de despedida da campanha eleitoral e uma despedida do Lula enquanto Presidente).
Ainda fui a pé até a Praça da Sé, pois não sei porque raios, achei que tinha uma caminhada da Marta com a Dilma antes, partindo de lá. Nada.
Metrô até o Tietê, mais uma pernada enorme até o Sambódromo Adoniran Barbosa, no Anhembi.
Povo. Muito povo. Quase todos mulatos, das periferias, gente militante do partido, cada um com suas mazelas, suas comunidades, seus sindicatos, suas grandezas. Muitas bandeiras e adesivos, muito samba e forró dos "jingles", repetidos muitas vezes, mas nem por isso pentelhos, estado de graça na comunhão com o "povão", posso até dizer a vanguarda do povão. Tomei dois copos de água de graça (viva o PT!), dancei sozinho agitando bandeiras, esperei horas por uns minutos de discurso do Presidente. Eu e dezenas de milhares de pessoas (gentis, cidadãos, fraternos, apesar do desperdício eventual de material de campanha; essa questão ecológica ainda vai longe Dona Marina!)
Caiu a chuva que pedimos a Deus (não exatamente naquela hora).
O Netinho levantou a galera, falando de negritude. A Marta idem, falando de feminismo, jogando confete na Dilma e na Dona Marisa.
A Dilma não é aquele carisma todo, mas não está ainda prá isso, é só sua primeira eleição (acho que ela vai fazer dois mandatos como o Lula e o FHC).
O Mercadante parecia um "peru que fala" do bem, vermelho e sanguíneo de mocidade exaltada, crendo na sua passagem para o segundo turno.
E o Lula, ah o Lula, todo alegria, emocionado falou que não éramos "nós" (= "a massa") que tínhamos que agradecer a ele, mas era ele que tinha que nos agradecer a militância e o apoio nas eleições anteriores e nesses últimos oito anos.
E contou contente que, se há trinta anos a Bovespa lhe fechava as portas com medo de depredações quando ele fazia passeatas no Centro Velho com bancários ou metalúrgicos, nessa última sexta feira tinha-lhe sido toda rapapés pois ele, o sindicalista que no passado lhes metia medo, hoje capitaneava a Petrobrás na maior venda de ações da história do capitalismo!
Molhado como pinto na chuva e feliz como pinto no lixo, saí do Sambódromo como quem sai de um Morumbi lotado quando o Timão goleia, peguei um táxi que me aceitou (um e outro me rejeitaram com medo de molhar seus bancos, acho) e chegando em casa tomei banho quente e coloquei o pijama. Vim aqui escrever esse texto, certo que a alma tinha sido lavada na chuva e no banho, mas mais que tudo, na comunhão com aquele povo onde ninguém era meu íntimo e todos eram (muito) companheiros.
Notei então que tive lá minha turma, pertenci a uma onda, fui mais um no meio de uma multidão feliz!
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